quarta-feira, 5 de maio de 2021

Caminhada nas traseiras do Palácio de Queluz



Estando lá é como estar num lugar secreto. Sentada no meio da vegetação e olhando de um ponto de vista elevado o jardim do palácio.
De longe o lugar parece banal. Afinal está mesmo encostado à IC19, e não é mais do que uma faixa de terreno, onde passam caminhantes, pessoas passeando cães e corredores.
A pressão suburbana ditou o que se fez por ali e praticamente estrangulou o Palácio de Queluz, que ainda conheci envolvido num ambiente mais rural.
O desenho ajudou-me a esquecer todos os constrangimentos e reforçou o sentir do que ainda há de mágico neste lugar. 
Começando a desenhar, logo reparei que ao fundo se vê a torre da Igreja Matriz da Amadora, o que ajudou a criar profundidade.
Ali, sentada no meio das plantas espontâneas, saboreio a vista das árvores do jardim do palácio, e os pequenos seres que por ali andam. 
A certa altura vi um pequeno caracol num ramo, relativamente perto de mim, e a partir daí trabalhei o contraste da imagem para que ele tivesse o seu lugar nobre no desenho.


terça-feira, 11 de agosto de 2020

Um jantar muito tranquilo com o Paulo J. Mendes em Paredes de Coura



A sensação foi de pintar com matéria viva. O vinho espesso com a potência da uva bem visível. Não resisto a um material dessa qualidade! :)
Os momentos que seguem uma refeição são muitas vezes momentos de grande prazer para mim, pela plasticidade de uma mesa já desarrumada, das nódoas de vinho ou azeite na toalha de mesa, e de toda a descontracção que a barriguinha cheia proporciona.
Eu não desenho habitualmente a comida quando ela chega à mesa. Esse para mim é o momento de saborear uma outra arte... e quando num restaurante, de saborear a arte de outros. Mas o final de uma refeição alongada no prazer de desenhar, é algo de que gosto muito.
Este desenho foi feito em Paredes de Coura, ao final do dia do encontro que aí se realizou com muitos participantes da actividade "Desenhos do Alto Minho, Sketching com História".
Ao final do dia apenas ficámos nós. O Paulo estava a fazer a residência artística dele ali e eu fiquei a jantar com ele, antes de regressar a Valença do Minho, onde estava a fazer a minha.
Fomos a um lugar onde servem comida mesmo caseira, o Barbaças, e onde fomos muito bem recebidos. Foi um jantar calmo, como nós gostamos. 
E eu fiquei sensibilizada de como as aguarelas dialogaram com o vinho minhoto. ;) 
Verde tinto... em malga, claro, como dita a tradição! 
E essa cor roxa ainda só a encontrei no Norte de Portugal e na Galiza.

sexta-feira, 17 de abril de 2020

O esquilo residente no quintal da Wendy




























Eu gosto muito de animais de estimação que andam livres. Alimentados e protegidos por nós, e portanto, criando-se um sentido de responsabilidade para com eles, mas mantendo a liberdade de todos.
Este é o esquilo que tive o privilégio de desenhar quando visitei a minha amiga Wendy, em Jersey City, fez agora um ano.
As aves, que penso serem tentilhões, mas que irei confirmar com ela um destes dias, para que a identidade deles fique registada e me ajude a regressar à memória desse lugar, vinham sempre que a Wendy generosamente lhes dava da mistura rica de sementes e frutos secos que para eles tinha num grande frasco.
A certa altura comecei eu a dar-lhes o alimento, e para me ajudar a atrair o esquilo para perto de forma a conseguir desenhá-lo, dava-lhe os frutos secos em pequenas quantidades ou um a um, e de cada vez conquistava alguns momentos para o desenhar e ia colocando mais alguns detalhes no meu desenho.
Ele comia alguns e ia esconder outros. E enquanto comia, eu reparava nos seus olhinhos atentos a mim e ao que se passava à volta.
Desenhar animais na Natureza é sempre uma experiência sensorial muito forte.

quarta-feira, 8 de janeiro de 2020

Cláudia Mestre


O retrato tem sido uma das minhas grandes paixões desde que me encontrei no gesto de desenhar. 
Cada pessoa, no momento em que a vou desenhar, tem as linhas do desenho já em si. Tem as sombras e a luz próprias do seu ser, o seu próprio ritmo e a sua própria dignidade.
Desenhar um retrato é servir esse ser que está em frente de nós.

Para mim, o desenho de um retrato é uma escultura de luz. Ao desenhar sou apenas uma servidora que deixa essa luz aparecer.
Amar e servir, pensei… como as divisas de uma ordem ou profissão. :)
Um pintor ou um desenhador é realmente um servidor. Toda a criatividade tem como função servir a vida, torná-la bela, luminosa. E não estou a falar de beleza como um artifício, mas da beleza límpida da alma, a beleza do próprio ser, com tudo o que faz parte dele.

E isto para dizer que este retrato da Cláudia Mestre me deu um prazer imenso a fazer, no ambiente feliz do 10º aniversário dos Urban Sketchers Portugal.
Estávamos sentadas num círculo de pessoas a retratarem-se mutuamente, aquilo a que chamam de duelos, mas que eu senti mais como um dueto, pela comunicação que se estabeleceu nesses momentos em que cada uma estava centrada na outra.
Agradeço à Cláudia pela disponibilidade de posar com a calma dela, e por ser uma pessoa tão serena, que trouxe toda essa luz ao desenho.
Quando olho para este retrato vejo uma figura renascentista, e ela é uma mulher afinada com o renascimento de uma nova era de respeito pela Natureza.


E aqui está o desenho que ela fez de mim. :)

segunda-feira, 30 de dezembro de 2019

Curar as águas. Feliz 2020



Esta pintura em aguarela foi feita à beira do Tâmega, sentada numa esplanada, olhando a outra margem e o movimento das águas do rio, e brincando, ou deixando as cores brincarem, com o que a paisagem me transmitia.
Há momentos que me fazem reflectir sobre a representação do mundo, o que é real e o que não, e ao acabar este apontamento senti que as águas estavam a falar comigo, a dizerem-me que o que vejo está muito para além do real fotográfico.

Desejo-vos que neste tempo que agora começa saibam reconhecer em vocês próprios e nos outros o amor que tudo coloca no lugar certo e tudo cura. O amor que transforma as vossas águas, e as águas de todo o planeta, e vos faz sentir, se permitirem, a pureza do que a Natureza nos ofereceu para viver. 
No nosso planeta cada vez mais será visível que somos todos um, e que as nossas diferenças são afinal tão iguais.


A todos, um 2020 cheio de Fé, Esperança e Amor!

sábado, 16 de novembro de 2019

Deixar a chuva desenhar





























Já estive em várias situações engraçadas desenhando à chuva, mas esta, no décimo aniversário dos Urban Sketchers Portugal, acho que superou todas as outras. 
Da parte da tarde um dos grupos foi com o Luís Miguel Frasco para o Miradouro da Senhora do Monte, e pouco tempo depois de lá chegarmos, já a desenhar, fomos apanhados por uma valente bátega.
Eu tinha começado a desenhar a paisagem com o Luis em destaque do lado direito, e a minha intenção era que desenhador e paisagem desenhada dialogassem no desenho, cada um dando força visual ao outro, ilustrando a intensa ligação que se estabelece entre desenhador e paisagem.

Grande parte do lançamento inicial do desenho era aguarela e quando começou a chover em grossas gotas e em força, não houve sequer tempo de proteger o caderno.
Foi uma chuva tão forte como rápida e logo parou, como podem ver nas fotografias que o António Alberto Frazão tirou de nós logo a seguir.

Apesar de se poder pensar que a chuva destruiu o desenho, eu gosto bem dele assim.

Já não lhe toquei mais. A natureza do tempo impôs-se e nas manchas e traços deixou a forte sensação daquele momento único, e refrescante. :)
Para mim este desenho manifesta uma das coisas que mais valorizo no acto de desenhar --- a observação do processo. O que fazemos orienta o desenho num determinado sentido mas o que acontece espontaneamente é aventura a viver e saborear.

quarta-feira, 6 de novembro de 2019

A caminho de Santiago


De autocarro a caminho de Santiago de Compostela vieram-me muitas saudades de fazer o caminho a pé.
Fiz a parte galega do caminho português em 2017, partindo sozinha de Valença do Minho, quando fui pela primeira vez ao Compostela Ilustrada, um encontro internacional de cadernos de viagem então na sua segunda edição.
Ao final da etapa que vai de Mós a Redondela, chegada ao albergue, saí para jantar. Dorothea, uma alemã com quem combinei ir após nos refrescarmos da caminhada, deu voz à nossa intenção de abrir o grupo a quem quisesse jantar connosco, convidando os peregrinos. Juntaram-se a nós uma japonesa e um outro português. E foi esse o momento do dia em que tive oportunidade de desenhar, desenhando-os enquanto conversavam e um pouco do ambiente do pequeno restaurante.
A meio do desenho pedi à Ju Won, também ela artista, que me retratasse no mesmo desenho. Parei para que me desenhasse e isso fez com que ficasse com uma expressão ausente, como se estivesse a sonhar e tudo o resto fosse o meu sonho.
O seu contributo tornou este desenho muito especial para mim, e exigiu também que transformasse um pouco a cor do desenho para acompanhar as cores intensas com que me pintou.
Lembro-me também que durante o jantar o tempo pareceu estar suspenso durante um longo momento, o que contribuiu para o ambiente do desenho.
Ainda voltei a encontrar André, o português, no início de uma outra etapa. Eu acordara de madrugada e estava a ler na sala de refeições e ele foi tomar o pequeno-almoço para partir bem cedo.
Só aí, na calma da madrugada, conheci melhor a sua história e compreendi porque caminhava mais depressa do que todos nós. Sendo militar em situações de emergência humanitária, tinha de estar preparado para chegar longe e depressa onde quer que tivesse de actuar.
Quando o encontrei pela primeira vez ouvira comentários sobre ele andar tão depressa, havendo dias em que fizera quarenta e tal quilómetros, o que corresponde a pelo menos duas etapas, e mesmo depois da conversa animada do jantar em que tivemos oportunidade de trocar impressões ainda ficara uma noção estranha sobre os seus motivos, pois só falou do entusiasmo em caminhar e de pormenores mais técnicos da caminhada.
Apenas essa conversa calma, em que lhe pude fazer as perguntas certas e ouvi-lo com o coração, me trouxe uma dimensão mais real e profunda desse homem.
E só aí compreendi também porque sendo ele alguém que falava com força e convicção, o desenhei tão suave e pacífico. Ouvindo no silêncio da madrugada curtos relatos do seu trabalho em tempos de paz, em serviço nos Açores, transportando pessoas das ilhas mais remotas, como ao transportar uma grávida de helicóptero em situação de emergência, até à exigente condição de estar em alerta para a qualquer momento poder entrar num perigoso cenário de guerra para proteger e resgatar pessoas, o retrato dele no meu desenho fez então para mim muito mais sentido.
Muitas vidas dependerão da sua preparação, que não é só física, e apesar dessa, a par da psicológica, ser uma componente fundamental do seu trabalho, também o usufruir de um caminho de tradição espiritual é, ou se pode tornar, um suporte, para ele e tantos que dali partem ao reencontro das suas missões e caminhos de vida. Faço votos que ao André lhe seja também uma protecção.
O caminho é feito de muitas historias e ritmos diferentes e de raros e belos momentos de comunhão, como estes.

terça-feira, 22 de outubro de 2019

O jardim do Campo Grande




























Os jardins das cidades falam-nos da nossa condição de seres naturais. Convidam-nos a sair da toca ao fim de um dia de trabalho, ou logo pela manhã, para o começar melhor.
São o reflexo de nós próprios, da nossa natureza e acordam aquela parte de nós com a qual devemos estar sempre em contacto. São o silêncio que conversa connosco em meio ao ruído geral, e guiam-nos de regresso ao nosso ser essencial.
A isso juntamos um amigo com quem passeamos ali de quando em quando e está desenhado e tecido um pequeno pedaço de paraíso.
Um que eu fui descobrindo aos poucos e é agora um dos meus favoritos, é o jardim do Campo Grande. Atravessá-lo de ponta a ponta oferece-me momentos mágicos.
Está a aproximar-se o dia de apresentar a oficina de desenho no museu Rafael Bordalo Pinheiro, que será daqui a um mês, e com os passeios de reflexão sobre esse lugar e esse grande artista, é agora um dos jardins da minha alma, impresso em cor e reflexos, mas também no movimento e vida que acolhe e a quem oferece generosamente a sua harmonia.
E um jardim é afinal como um amigo, por muito que nos encante só por o conhecermos, são os momentos que passamos na companhia do outro que reforçam o laço, e o tornam mais doce, mais profundo, e direi mesmo, imortal.

quarta-feira, 10 de abril de 2019

A luz que ilumina o coração





Já há um tempo que queria começar um blog, mas sempre pensava que gostaria de o fazer com o sentimento certo, onde estivesse a luz e a sombra de mim própria, trazendo claridade e abrigo ao meu mundo.
De uma forma simples, amiga, como o canto de um pássaro, que não sabemos o que diz, mas o entendemos no coração, com o coração.

Começo então com uma imagem que me diz muito por eu sentir que não se deixa rotular como uma coisa específica, pois sou eu assim, múltipla na minha criação. É ao mesmo tempo sketch, pintura ou ilustração, ou apenas uma imagem que me dá muito prazer.

É onde o meu coração se sente bem, naquilo que é livre, que respira, nos faz e nos ajuda a respirar liberdade.

Foi feita com aguarelas e marcadores.

Bem-vindos ao meu jardim, sob a protecção desta laranjeira que muito amo, representando a Natureza sob a forma de qualquer árvore que nos acolhe na sua sombra, oferecendo-nos o seu ar fresco, as suas flores e frutos, a sua pura energia.